Há uns anos atrás, quando as motorizadas eram ainda coisa para " homens", ou trabalhar nas obras e andar de capacete "Blade" ou "Motassis" empoleirado na cabeça era o expoente máximo da virilidade inquestionável,costumávamos chamar ás ridículas scooters de plástico o nome de " Aceleras" e "Aspiradores". Porque era só preciso rodar o punho do acelerador para se colocarem em movimento. "Aspiradores",porque com um vigoroso movimento do punho direito a pequena moto arrancava com dificuldade fazendo um barulho parecido com um aspirador Hoover. " Secador de cabelo", também lhes costumavamos chamar. Pelas mesmas razões.
Independentemente da velocidade ou do esforço, os ridículos veículos emitiam sempre um som equivalente a uma vaca a mugir através de um algeiroz:" Muóóóóóóóóóhnnnnnn!" . Lembro-me de, como qualquer adolescente nos anos oitenta, atirar o barro à parede lá em casa, colocando folhetos estratégicamente colocados com imagens das lustrosas motos. Verdade seja dita, a Honda Vision com aquele azul fluorescente a tresandar a anos oitenta, era um "must" ás portas das escolas secundárias, contra as quais as Vespas 50s usadas cheias de betume nunca poderiam competir. Como poderíamos justificar ás miúdas do "Oitavo D" que nos fazíamos deslocar no mesmo modelo de moto do Ti Arlindo peixeiro que até tinha um pára-brisas e um caixote de fruta preso com cordéis na traseira?
Mas dar o equivalente a dois salários , ou o triplo do que custava uma Vespa em segunda mão, não estava propriamente na agenda de muitas famílias a braços com a crise económica dos anos oitenta em Portugal ( Que se me perguntarem, julgo que nunca mais acabou e ainda dura até hoje...) Os "órfãos" dos aspiradores, foram então em boa hora empurrados para o universo das Sachs e das Casal Boss. E das Vespas. Para as urtigas com os "aspiradores"!
Casal: Uma moto como deve de ser. Para malhar então, não há melhor... ( Guarda-lamas da frente e silenciador, acessórios para os "betinhos"...)
Em suma, não haviam nomes jocosos suficientemente ultrajantes para classificar aqueles veículos. E em boa justiça, perfeitamente aplicáveis. A custar largas centenas de "contos de reis", as diminutas motorizadas mais não eram do que frágeis eletrodomésticos com um tubo de ferro fininho a fazer de quadro, cobertas por plástico que amarelecia com o Sol, e um motor e sistema elétrico feitos por camponeses num país oriental.Nunca haviam peças sobressalentes nem plásticos para substituir os partidos, por isso ao contrário da Vespa, esse ícone do motociclísmo que quando caía nunca se partia, apenas precisava de betume e umas marteladas, estas pequenas scooters " aspiradores" eram frequentemente um conjunto de ferros desengonçados a deslocarem-se na via pública com escape roto.
Circular num veículo destes, era o mesmo que passear nú no Rossio pintado de verde ás bolinhas com uma bandeira a dizer " Por favor, detestem-me!" Um verdadeiro suicídio social.Nunca soube como é que a malta que tinha "aquelas coisas" nunca considerou antes ir a pé ou de autocarro. Assim de repente, não me consigo lembrar de um veículo mais tenebroso e detestável. Talvez o Citroen AX...
Esta história vem a propósito de quê? Bom, no passado Verão, quando fiz uma pausa numa etapa da minha viagem pela Europa a bordo de uma Volkswagen, parei no meu barracão em Tomar, onde repousam os "restos" da minha Vespa 50s da minha adolescência. Passou à "reforma" quando mais tarde comprei uma 150 Sprint. Precisa de um volante magnético, e claro, betume.
Como qualquer jovem dos anos oitenta que se preze, tive de ir trabalhar para as obras numas férias grandes para poder comprá-la. " As motas são perigosas e ainda te matas nessa m****", era a frase de eleição dos nossos pais, que por peso na consciência, ou genuína falta de dinheiro nunca condescenderam em nos comprar uma moto. Graças a não ter tido papás que me compravam tudo, pude experimentar máquinas mais "pobres",mas indestrutíveis que me deixaram memórias indeléveis. Amandei uns malhos do caraças, mas fiz viagens e passeios extraordinários onde aprendi a respeitar as máquinas e a apreciá-las. Lagoa de Albufeira-Costa da Caparica pelo areal numa Piaggio Bravo.
Almada-Almeirim de Casal Boss. Lisboa-Porto de Vespa . Lisboa -Barcelona de Vespa. Recta do Infantado de Gazela 50cc a fundo a 45 km por hora ( A caminho da estação do Barreiro, para o Faria embarcar a mota para Beja) Almada-Beja de Sachs V5. Eu sei lá...
Os "aspiradores", entretanto, desapareceram do mapa, pulverizando-se em pequenas peças de plástico, e condenados por falta de peças e pelas modas. Se eu tivesse tido uma, se calhar tinha-a partido toda em menos de nada, e nunca mais queria saber nada de motas. Hoje em dia, a indústria ainda insiste nestes eletrodomésticos de plástico, e muitos modelos continuam a jorrar diariamente pelas portas das fábricas, mas felizmente, feitos com a mesma qualidade e durabilidade. Muito pouca ou nenhuma.O que poupa a Humanidade de ter de pactuar muito tempo com estes objectos. De novos a lixo, apenas decorrem um par de anos, e podemos nos esquecer delas e continuar com as nossas vidas. Meros electrodomésticos produzidos o mais barato possível para nos obrigarem a ir comprar outro passado pouco tempo. Tal como uma máquina de lavar velha, um frigorífico ou um Citroen AX. Ou um aspirador...
5 comments:
Eu gosto de "aspiradores"! ;)
Que é que eu posso fazer? Não vou á bola com isto. Acho que é dinheiro mal gasto... Porque é que custam tanto como as motas " normais" com mudanças? Já que é para serem simples e de plástico, que tragam o preço cá para baixo.
Mas não...
Desculpa lá a "má publicidade" a este sector das motas...
Pois é caro Mike eu tb tinha a mesma opinião sobre os aspiradores e tb tenho uma 50s (1966) a precisar de restauro, que passou "as passas do algarve", na minha mão e dos donos anteriores.
Mas recentemente quiz voltar às duas rodas, não sou dado a velocidades em cima delas, mas gosto de algo bonito à vista e que me permita circular entre as duas margens do Tejo sem me preocupar com transito na Ponte 25 Abril, acabei por regressar à Vespa... mas lá teve de ser automática. Não é a mesma coisa, mas é uma questão de hábito. Aspirador sim... mas desde que tenha estilo.
No problem! :)
Sim,amigo Castanheira, aspiradores, tudo bem, desde que com estilo e que nao nos deixem apeados.
Acho que os "aspiradores" evoluiram muito nos ultimos anos e ja nao tem nada a ver com "estes".Esta foi sobretudo uma cronica para relembrar os aspiradores " reles " de outrora. Seja como for, acho que estao um bocado carotes, quando comparados com motas " como deve de ser.
Ate ja.
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