Da primeira vez que voei com a RAF, no longínquo ano de 1992, lembro-me do frio cortante de Novembro na Base Aérea 3 em Tancos. Nada que impedisse a tripulação britânica do C 130 de vir em calções, passar uns dias como parte do seu treino de para-quedistas no estrangeiro. Algo incompreensível e estranhamente sobrenatural, para quem sobrevivia no extremo frio do Centro de Portugal, nuns míseros e desumanos 12 graus coberto em casacos de abafo. Mal sabia que duas décadas quase depois, iria para o Reino Unido andar de manga curta a chover, com cinco graus...
Desassete anos depois, mais concretamente hoje, voltei a voar na companhia dos "airmen" de sua magestade, a bordo de um Westland Sea King, um modelo de helicóptero com 40 anos, que será brevemente retirado de serviço. Apesar da idade, o modelo que já viu serviço nas Falklands e no Afganistão, vive agora uma vida de pré-reforma no serviço de busca e salvamento da RAF no Sul de inglaterra.
A comparação os "lusos" Puma, é inevitável: Construídos basicamente na mesma altura, com propósitos semelhantes, a de proporcionar um helicóptero logístico versátil de grandes dimensões para as forças armadas, o Sea King pode ser adaptado a uma ampla opção de configurações, e transportar considerável carga suspensa. A idade do aparelho é imediatamente perceptível no interior, algo desgastado e com aspecto usado, e não fosse eu ter visto chegar o aparelho, precedido com aquele barulho de batedeira de ovos insonorizada lá ao longe, seguida da visão de um rotor enorme fazer uma ventania que açoitava as redondezas e despenteava toda a gente, iria julgar que "aquilo" tinha sido trazido para aqui de camião.
Mas não. Um Sea King completamente "Airworthy". De 1968, segundo Ian Clark, o nosso piloto desta manhã me informou. Sem tempo para grandes apresentações ( deixemos isto para depois), apenas houve tempo para colocar o cinto num dos bancos de lona transversais, enquanto os motores por cima da nossa cabeça ligavam com aquela sequência de arrepiar do costume: Primeiro um silvo crescente, como uma panela de pressão, depois um "arroto" possante que indica a entrada em funcionamento das turbinas. Quando o barulho se assemelha já a um concerto de AC/DC ouvido junto a um altifalante, a comunicação torna-se apenas possível por gestos.
Fasten your seatbelts...Welcome to an icon! ( Meto-me em cada uma!...)
Sem nada avisar, a descolagem acontece de um modo como só os helicópteros podem proporcionar: Em poucos segundos, as árvores começam a ficar assustadoramente lá embaixo, enquanto um barulho que se assemelha a um tambor tocado por um indígena em vésperas de partir para a guerra soa possantemente sobre as nossas cabeças, elevando-nos. Em menos do tempo que demora para colocarmos os auscultadores de modo que possamos ouvir o Comandante, estamos já a 1000 pés de altiutude, descrevendo círculos sobre a estonteante paisagem inglesa de Chichester.
Uma vez "airborne", é possível circular dentro da aeronave,algo impossível de fazer por exemplo num Jetranger ou num Allouette III. Graças a uma abertura na fuselagem,em vez de Brownings disparando sobre Talibans, é possível agora tirar fotos impressionantes das redondezas. Tempo para uma foto fugaz do cockpit, e para ouvir as explicações do Sargento que nos acompanhava, falando do centro do Sea King, agarrado a uma correia no tejadilho , equilibrando-se como num autocarro.
Vista aérea da região de Chichester, no Sul de Inglaterra, a partir do "King".
A manobrabilidade do Sea King é surpreendente para uma aeronave desta dimensão. A sucessão de "bankings"( curvas , embora não saiba o termo correcto em Português), e o assustador "Pitch down" ( empurrar o manche para a frente originando uma "queda" brutal com G,s negativos que nos faz faltar o ar), embora como parte da demonstração, deixam perceber a que capacidade de operação deste eficaz helicóptero em teatro de guerra ou de salvamento continua no seu melhor e que em nenhuma circunstância a segurança fica comprometida. O açoitar das pás devido ás súbitas mudanças de direcção e comportamento, são francamente ampliadas pela abertura na fuselagem , fazendo um barulho medonho e preocupante.
No entanto, o record de segurança dos King é vasto, e históricamente é um dos helicópteros militares mais seguros do Mundo, tendo feito por todo o Globo milhares de horas debaixo de fogo e em condições climatéricas adversas. A aterragem, momento menos esperado por todos, acontece irremediavelmente, e as indicações do Sargento para ficarmos sentados são descaradamente ignoradas. Tempo para ver Ian a fazer um "hovering" perfeito segundos antes de tocar no chão. Acabou. Obrigado por terem viajado com a Royal Air Force.
Mike Silva aos comandos de um "Sea King " da Royal Air Force
Como não podia deixar de ser, A equipa de Sala das Máquinas ficou ainda mais um bocado à conversa com Ian ,e Abbots, o co-piloto. Não me ia embora dalí sem experimentar sentar pelo menos no Cockpit . Apercebi-me então, que toda a instrumentação do aparelho é ainda analógica, sem nenhum "update" ou modificação actual. Por vezes, instalam GPS e outros aparelhos electrónicos para actualizar. Neste,nada! -Um helicóptero clássico! -Pensei imediatamente. Este Sea King voa tal e qual como há trinta anos. Mesmo o RADALT, para detectar a altitude via Radar, é o original! Lá estavam os habituais Air speed indicator, Attitude indicator e altittude indicator. Mas não espanta.Mesmo os "computadores com asas" da actualidade, cheios de ecrans como se fossem uma loja da Worten, têm sempre como "backup" uns instrumentos originais "antigos". ( Whats the point then?...)
Os controles do "King" surpreendemente de origem...nada de "modernices"
Deixo este Sea King com saudade, e com pena de semelhante máquina estar prestes a servir de peça de museu. Pode ser que um dia, o volte a ver em Cosford, ou no Fleet air Arm. Com uma tabuleta em frente a explicar Às crianças que modelo era aquele. Então lembrar-me-ei deste vôo memorável de hoje...
Thanks RAF for the opportunity.
2 comments:
Caramba! Tanto apetrechos nos comandos, controlo!
E pelo o aspecto, só podia! ;)
Jinhos
Deve ter sido uma bela experiência, ainda para mais num clássico da RAF.
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