Muitos Caterhams vieram por estrada , desde vários pontos das Midlands, até Curborough.
Pilotar um Caterham debaixo de neve? Com o clube da marca em Inglaterra? Com malta acessível e franca? Numa pista particular ? Á borla?
"Oh my God!"
Texto e fotos:Mike Silva
"Primeiro fazem-se patinar as rodas, antes que o comissário dê a partida. Isso aquece os pneus", dizia Simon Rogers do Lotus Seven Club durante o Briefing para os "pilotos" maçaricos que iriam pela primeira vez fazer uma prova de sprint . Com uma tenda enorme e um gerador a fazer trabalhar um ecran de plasma gigante, este bem organizado clube fazia esquecer os oleados laterais que abanavam violentamente com o vento frio e gélido.
O bem apetrechado clube da marca, gerido com rigor militar, não deixa faltar nada a uma sessão de "briefing" para os pilotos ...
Durante um exame obrigatório a pé ao circúito de Corborough, onde nos era indicado rigorosamente onde colocar " a roda", em cada curva, e nos era mostrado os pontos perigosos e os possíveis locais de despiste, bem como precauções a ter em cada momento, aprendi mais sobre desporto motorizado e condução desportiva do que toda a minha vida. Mal podia esperar por ir buscar o "bicho".
Carro de ricos? Só se fôr em países de terceiro mundo. Aqui, o Caterham é uma "moto" ou um segundo carro...
Para meter "nervos", Simon levou-me primeiro numa "demonstração", com o seu super Seven com 230 cavalos. É como se fosse um míssil atado a um balde do lixo! Quando ele me apertou vigorosamente os cintos de quatro apoios, e verificou se eu tinha o capacete bem preso, sabia que mais uma vez me tinha metido em trabalhos.
Isto de andar a chicotear 200 e tal cavalos num espaço restrito, faz com que por vezes os HP amuem...Mas dez minutos depois, já a "trovoada" estava de novo em pista...
Como se tivesse sido pontapeado pelo Godzilla, o pequeno Caterham empurrou-me violentamente as costas enquanto urrava como se tivesse sido atacado com uma bola de ferro com picos. Em menos de nada, a primeira curva deste circúito local particular apareceu a um ritmo acelerado demais para o meu cérebro conseguir digerir, e mal dei por mim tinha o maxilar no pára-lamas, e caminhava a alta velocidade para a "Chicane ". Com um ensurdecedor barulho de destruição da caixa sequencial, e um zunir esbaforido dos carretos "direitos" , o Super Seven colou-se ao "zig zag", como se estivesse sobre carris. E o meu maxilar algures entre o guarda-lamas e o Tablier de fibra de carbono.
Vai lá tirar mais umas fichas, porque eu quero andar mais! ...
"Nem em cem anos eu consigo fazer isto", pensei com os meus botões". A curva em gancho feita por fora " a dar gás", enquanto os pneus chiavam no limite, fazendo o carro deslocar-se de lado como se tivesse umas rodas de cadeira de escritório, apenas antecederam um agredir violento do acelerador para a única recta do percurso. Novamente uma curva, e a sensação de ter o cérebro em cima do capot. O gritar dos carretos e aquele trombone de escape mesmo junto ao meu cotovelo drogavam-me como um elefante atingido por um sonífero no Botswana, e pecaminosamente apenas desejei que tudo aquilo terminasse rapidamente.
O modelo novínho em folha, já com o motor Ford Sigma, de 2008, para comemorar os 50 anos da marca. Mas ainda estava na rodagem...
A paisagem de repente desfilou perante mim num rodopio silencioso. Não foi propriamente a paisagem que rodopiou, mas Simon, que me garantiu ainda não se ter despistado esta época, mas que apenas tinha acontecido porque estava empenhado em me atormentar. Um pouco como quando voei com os "Rotores de Portugal", a esquadrilha acrobática de Allouette III. Tentaram fazer -me vomitar para ver se eu pagava uma "grade"...
O final da "demonstração", serviu para subir a fasquia acerca das minhas expectativas sobre como "apertar" com um Caterham. Um Caterham é como uma sopa da Pedra: Pode se ir acrescentando, até atingir o resultado desejado.
O meu, é como uma embalagem pré-congelada comprada no Hiper. O Caterham de Simon , é como um bom restaurante de Almeirim. "Caterham,nevertheless...", conforta-me Simon.
O movimento à volta dos Caterham em Inglaterra, é saudável e amigável. Habituados que estamos a ver estes extraordinários bólides serem conotados com classes mais abastadas que frequentam os encontros de cachimbo e livro de cheques, é uma agradável surpresa encontrar pessoas "como a gente" na posse destes bólides. Um mero imigrante que outrora tinha de empurrar um Renault 4 para ir trabalhar, pode sem esforço adquirir um destes carros como se de uma vulgar CBR se tratasse.
Um exemplo! Estes habitantes locais que "gostam destas coisas" acharam que a pista local deveria ter meios de apoio...Vai daí, construiram uma ambulância e um pronto-socorro! Tudo artesanal! Well done,folks!
Nesta cena, tanto se observam proprietários a rebocar atrelados dispendiosos com carrinhas M5, como outros a virem por estrada com o mapa no banco do pendura, cheios de lama atirada pelos camiões. A ouvir GNR no MP3, porque auto-rádio seria uma heresia. Todos convivem sem "peneiras" uns com os outros, e trocam dados de telemetria para conseguirem melhores resultados na próxima volta.
O controverso motor Série K, bastante "envenenado"...
Entretanto, começou a nevar! Sim, a nevar. Nada que perturbasse a "equipa" da Topos & Clássicos, que permanecia inamovível na fila para o arranque. Este percurso de "sprint" apenas permite um utilizador na pista, como se fosse uma rampa. Porreiro! A primeira vez que vou experimentar um Caterham numa pista, estão três graus negativos e neve sob um vento tão forte que "cai" na horizontal...
O vento era tão forte, que a neve "caía" na horizontal! Ah, e estavam 3 graus negativos...
Eu sou maçarico, por isso o acelerador estava volta, não volta cá em cima, pois o piso estava " verde" na gíria da competição, o que significa escorregadio. "Apenas" fiz mais quinze segundos que Simon, o que em termos desportivos equivale a fazer uma corrida para ver quem chega primeiro a Benfica, partindo eu do Colombo e Simon de Sacavém, e ele chegar primeiro ao Fonte Nova do que eu!
Ter começado a nevar, só ajudou o espetáculo!
Pretendo voltar a esta pista, agora que já sou " experiente" e testar outro tipo de veículos. Mais uma vez, não consigo de parar de me surpreender com a forma simples e recompensadora com que os ingleses vivem o automobilísmo. Como se fôsse uma segunda pele. Como se fôsse respirar.
Eis como transportar os "cavalos" para eles não se constiparem...
Mesmo esta pista, aberta ao público gratuitamente , embora sob marcação, como se fosse o campo da bola do bairro , onde se tem de ir buscar a chave à junta de freguesia, é um monumental golpe na mentalidade de que isto do desporto automóvel é só para os felizardos com um familiar importante, ou uma carteira recheada.
Não é. Pelo menos por estes lados...