Quem me conhece, sabe que gosto de pisar os caminhos menos trilhados. Um dos meus mantras, é o de que "só os peixes mortos vão com a corrente". No início dos anos oitenta, quando toda a gente estava desenxofrida para comprar AX e Unos novinhos em folha nos Poligrupos, eu insistia em circular com carochas, amiúde bloqueados por vizinhos que estacionavam atrás, pensando que eram carros abandonados. Não eram, conforme muitos descobriram quando a SACHS da policia aparecia para os multar por mau estacionamento. Toma lá uma multazita para não pensares que isto é só para os carrinhos novos.
Hoje em dia, qualquer cão e gato julga que sabe de carochas, e provavelmente tem um. Os encontros passaram a necessitar de um crédito pessoal para obter a inscrição, e é mais comum ver um carocha, do que um AX. Por isso, decidi rumar a outra faixa dos clássicos, pouco frequentada e de onde posso tirar um prazer e uma experiência única e acessível. Os autocarros!
Ninguém passa cartão aos autocarros! " São muito grandes ", "Não têm sítio para guardar", " são dispendiosos de manter", são algumas das desculpas mais comuns. Todas falsas, e proferidas por quem pouco percebe da coisa. Dá-se o desconto. Ainda bem, porque assim , a cena dos autocarros clássicos poderá ficar a salvo dos doutoures e dos endinheirados de camisa de marca, por mais algum tempo. Nem vou aqui dizer o quanto estão errados, nem como é tão estupidamente simples possuir e manter um autocarro, porque senão começavam a pedir um balúrdio por um Kassborer Setra todo pôdre...Já sabemos como é que é.
Aos comandos de um Bristol VR. Do meu clube P.O.P.S...
Deixemos os autocarros para os conhecedores. Um autocarro, é um veículo social. Permite que várias dezenas de pessoas sejam transportadas, e o convívio surge naturalmente. Permite que pessoas que não têm posses para adquirir um clássico, ou não estejam pura e simplesmente para aí viradas, tenham um contacto com a cena dos clássicos, e percebam um pouco o pulsar desta comunidade de amigos. E se alguém tivesse menosprezado esta relíquias?
Sobretudo, permite uma avalanche de memórias e sentimentos profundos, impossíveis de atingir com qualquer outro veículo. Circular num autocarro clássico, cheirar a napa dos bancos, sentir o ranger dos varões, ouvir o ressonar dos carretos da caixa de vleocidades, e ser abanado pela passagem das mudanças, transporta-nos imediatamente para o tempo em que tudo era mais simples e eramos mais felizes.
Ora aqui está algo que não vemos todos os dias...
Circular por entre os campos de giestas e de verde contagiante, ao som de um poderoso e antigo "seis cilindros em linha", dividindo a atenção ao exterior com a contemplação do interior que resistiu a um uso intensivo e por vezes vandalizador, é algo impossível de explicar. Só experimentando. É GRATÚITO!
Não troco uma simples viagem num autocarro com várias décadas, onde os meus sentidos são fortemente chocalhados por memórias , por um passeio em bichinha pirilau atrás de MGs e Carochas. A pagar balúrdios. Mas isto sou eu, não liguem. E não liguem aos autocarros por aí espalhados, pois não vale a pena. Não são descapotáveis, nem têm clube. Não se preocupem, que os Ingleses e Alemães vão aí abaixo com uns semi-reboques "limpar" o nosso quintal desses montros horrorosos.
Não se preocupem. Em breve, estará tudo limpinho...
4 comments:
Manter um autocarro em Portugal é muito complicado...
Cá em Portugal, um autocarro que não sirva para serviço comercial, é um mono que ocupa espaço, espaço que pode ser ocupado por outro que dê melhor rendimento...
É incrívelmente estúpido como o Português tem tendência a esquecer-se rápidamente do passado, como se isso fosse motivo de vergonha...
Mas volta meia volta lá se ouve "no meu tempo é que era bom"... Mas fazer alguma coisa para preservar as memórias desse tempo, 'tá quieto!
Eh eh realmente o homem é um animal de hábitos, ainda me lembra quando tu passavas as manhas de Domingo a desmontar os motores dos teus para cima de vários VW, e enquanto isso outros animais de hábitos mas mais líquidos como Cerveja, Moscatel e Licor Beirão, comentavam da janela do quartel aquele gajo é maluco… E lembras-te do auto-tanque Nº 6 que tinha um sistema de arrefecimento parecido com os do carocha, aquilo é que era uma maquina. Afam só damos valor ao que não temos.
Um abraço
Carlos Mata
Grandes tempos que me lembraste agora, Mata!
De facto, se bem te lembras, convivemos de perto com grandes máquinas que hoje valeriam um balúrdio! Ai se eu tivesse o "tarolas e pandeiretas" ! ( Autocarro Magirus Deutz de 1951, com rabos de peixe e tudo)
Manter um autocarro clássico? É bem mais simples do que parece...Aqui, fazem passeios onde as pessoas contribuem livremente, e fazem publicidade nos paineis laterais. Por vezes, apenas a troco de deixarem parquear gratuitamente nas suas instalações...E usar a maquinaria !
E mais, muito mais.
Obrigado pela vossa preciosa colaboração e feedback.
PS:
O "Tarolas e pandeiretas" deve ter sucumbido nalgum ferro-velho"...Paz á sua alma.
Quanto ao "maluco", ele está neste momento na Flórida,a ver no mapa como é que se vai de Miami para Key West...Quero lá ir ver aquilo...
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