Saturday, 24 May 2008

Tempo de mudança


Inglaterra, é algo que não se consegue explicar.

Todos os que um dia tiveram de traçar o seu destino passando por este País, concordam comigo quando digo que nada do que encontramos aqui, desde o primeiro dia que chegámos , se assemelha à idéia que tinhamos antes de partir.

Acostumados que estavamos em Portugal a aprender a lingua inglesa com sotaque porto-riquenho nas escolas, mesmo nas mais caras ,com nomes ingleses e tudo, eis que por exemplo caímos de Pára-quedas em idiomas e dialectos locais. "Eyup Mate? How at? Dust know arfur tow crate?"

Isto por exemplo, torna um qualquer privilegiado cujos papás lhe pagaram caríssimas lições de inglês num colégio no centro de Lisboa, num rotundo analfabeto. Mesmo um professor universitário com vários anos de Inglês, será tomado por um israelita, mal abra a boca.

Isto vem a propósito de quê? Acontece, que muitos de nós, vêm mais ou menos com ideias preconcebidas e mais ou menos definidas, do que pretendem fazer uma vez em Inglaterra. A ideia que temos de Inglaterra, por vezes, e erradamente, é que é uma espécie de Portugal em que se guia do lado contrário. Ainda por cima, "é a CEE!" Por isso, pensamos que basicamente, basta seguir o modelo de vida e comportamento a que estavamos habituados em Portugal, perder tempo numas filas, e andar com um quilo de documentos atrás, que tudo vai correr bem.

Não perdemos muito tempo a pensar como vai ser a nossa formação, principalmente porque já somos uns "velhos" de 30 e poucos anos, e desde que consigam lavar uns pratitos, e comprar uns paposecos, já está muito bom.

Por isso, vir para Ingaterra para trabalhar com automóveis clássicos, foi como se me tivesse saído a sorte grande! Ganda pinta! Nem olhei para trás, e larguei o meu emprego efectivo no maior clube português.

O problema, é que as coisas aqui em Inglaterra não funcionam como em Portugal. Entra as nove, sai ás cinco, e dá cá o ordenado ao fim do mês. Em inglaterra, principalmente em pequenas empresas, espera-se "commitment", que é uma palavra cara para justificar a ausência de tempos livres , e trabalho "pro bono". Depois, no panorama dos automóveis clássicos, abundam os "investments", ou seja, automóveis que são comprados e vendidos apenas como peças de arte e de lucro, e não como objectos para usufruir da estrada e do tempo.

É como ser casado com a Kate Beckinsale, e dormir em camas separadas.Esperamos fascínio e entusiasmo, e encontramos pragmatismo e formalidade. Por outro lado, trabalhar com clássicos em Inglaterra como profissão, é como trabalhar com a esposa no mesmo emprego. Uma situação que leva ao desgaste. Eu já não posso ver Rolls e MGs! Nem Jaguares E!

E a sociedade inglesa empurra o cidadão para a promoção pessoal, e para o desenvolvimento intelectual. Os autocarros ,as ruas e a TV, anunciam até à exaustão locais onde podemos melhorar o nosso conhecimento. É natural uma empresa admitir funcionários de 60 anos. "We value experience", dizem os cartazes.

Por isso, ingressei num programa que certifica as minhas aptidões profissionais, chamado NVQ , ou National Valuation of Qualifications, que uma vez concluido me permitiu olhar para o mercado de trabalho com interesse, onde algumas propostas interessantes começavam a surgir.

A hipótese de trabalhar como Engineer na maior empresa rodo-ferroviária do Reino Unido, que opera também nos EUA e na Escócia, acedendo a um leque de formação internacional e a uma metodologia de trabalho confirmada, levou-me a deixar há alguns meses o trabalho em redor do veículo clássico como profissão.

Esta minha nova ocupação, vai mais de encontro ás minhas expectativas como pessoa e como profissional. Acredito que o interesse por veículos clássicos, só faz sentido quando olhamos para o Automóvel no seu todo, sem fundamentalismos. Acho muito mais interessante um Porsche 911 Carrera 4 novinho em folha, do que uma carroça com um fogareiro atarrachado, dentro de um vitrine num museu. Gosto muito mais de um Ford Sierra Cosworth de 1988, do que um Ford T. E respeito todos pelo seu contributo para a História do Automóvel.
Acredito sinceramente que evolui,pessoal e profissionalmente, com este passo. Ñão tenho pena de ter largado a minha anterior ocupação, onde fiz grandes amigos para sempre, mas este sector do restauro de clássicos peca por não oferecer estímulo para as expectativas individuais de cada um. É aquilo, e aquilo, e acabou-se. Obrigado a todos por estes excelentes e inesquecíveis três anos.

O futuro do Sala das Máquinas, longe de estar comprometido, dispõe agora de mais tempo e estrutura para percorrer o Reino Unido e arredores, em busca de máquinas e automóveis que povoam os nossos sonhos.

Esta , é a Sala das Máquinas!

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